Conheça a história do cordel através dos versos.
O CORDEL: SUA HISTÓRIA, SEUS VALORES
Autores: Marco Haurélio e João Gomes de Sá
No Nordeste brasileiro,
Conservados na memória,
Romances, contos e xácaras
Lembravam a antiga glória
De Portugal e da Espanha,
De que nos fala a História.
Era esse o tempo das gestas
Dos cavaleiros andantes,
E essa poesia rude
Dos bardos itinerantes
Foi trazida para a América
Dos bardos itinerantes
Foi trazida para a América
No bojo dos navegantes.
Essa poesia foi
Cantada pelos jograis,
Celebrando os grandes feito
Dos heróis medievais
E também falando sobre
Romances sentimentais.
E quando começa o ciclo
Das Grandes Navegações
De Portugal e da Espanha,
As antigas tradições
Vão se acomodando aos poucos
Pelas novas possessões.
No Brasil, as tradições
Assim vão se fixando,
Com as levas de colonos
Nas caravelas chegando,
As regiões litorâneas
Vão pouco a pouco tomando.
O índio, dono da terra,
Pra não ser escravizado,
Vivendo no litoral
E se sentindo acossado,
Resiste, contudo vê
O seu esforço baldado.
Da África chegam os navios
Dos traficantes negreiros,
Que tornarão em escravos
Os que antes eram guerreiros
E que agora vão servir
À sanha dos fazendeiros.
As etnias e as crenças
São assim amalgamadas
E a cultura popular
Vai recebendo camadas,
Que em todos os segmentos
Até hoje são notadas.
Eis um resumo apressado,
Contudo bem consistente
Para mostrar que a arte
Não brota espontaneamente,
E com o nosso cordel
Também não é diferente.
No Brasil colonial
Um embrião já havia
Do cordel na conhecida
Tradicional poesia,
Ou mesmo na catequese
Que a Igreja promovia.
Excertos da tradição
Que no cordel se encerra
Estão na obra do vate
Gregório de Matos Guerra,
Que foi o maior dos sátiros
À habitar esta terra.
À habitar esta terra.
Já no século XIX,
No Brasil imperial,
Resistia a escravidão
Um desnecessário mal.
Esse regime abjeto
Na pena teve um rival.
Foi o bardo Castro Alves,
Grande poeta baiano,
Que na arte que abraçou
No Brasil é soberano,
Lutando contra a injustiça,
No verso se fez arcano.
O grande Gonçalves Dias,
Dos termos do Maranhão,
Compôs na velha linguagem
Sextilhas de Frei Antão.
Portanto, também está
Na linha de evolução.
Porém é da pequenina
Paraíba o privilégio
De ver nascer o poeta
Que empunha o cetro régio
Da poesia do povo,
Templo majestoso, egrégio.
Leandro Gomes de Barros
É o nome do menestrel
Que deu forma e deu essência
Ao que chamamos cordel,
Que da tradição oral
Migrava para o papel.
Grande poeta satírico
E lírico maravilhoso,
Escreveu obras eternas
Como O Boi Misterioso,
E A Donzela Teodora,
De modo criterioso.
De sua lavra saíram
O Reino da Pedra Fina
Também O Príncipe e a Fada,
Que são Baman e Gercina
E o clássico inigualável
Chamado Alonso e Marina.
Outro grande pioneiro
É Silvino Pirauá,
E entre ele e Leandro
Sempre se perguntará
Quem foi que editou primeiro,
E a dúvida persistirá.
Pirauá era de Patos
E Leandro de Pombal.
Ambos vão pra o Recife
E lá se encontram afinal,
Onde Pirauá se mostra
Um cantador genial.
Pirauá introduziu
Na cantoria a sextilha,
Também inventou a deixa,
Que foi uma maravilha.
É por isso que seu nome
Entre os pioneiros brilha.
O Capitão do Navio
É a ele atribuído
E Zezinho e Mariquinha,
Outro folheto querido,
Da memória popular
Nunca mais foi esquecido.
Também entre os pioneiros
Deve ser mencionado
José Galdino, o Zé Duda,
Poeta bem inspirado,
Repentista e de bancada,
Nos dois gêneros afamado.
E Pacífico Pacato
Cordeiro Manso também
Um poeta alagoano,
Que nunca usou de desdém,
Foi um poeta-repórter
Como os que hoje inda tem.
João Melquíades Ferreira
Dedicou-se à cantoria
E no cordel escreveu
O Valente Zé Garcia.
Severino Milanês
Versava com maestria.
E João Martins de Athayde
No cordel foi professor.
Quando Leandro morreu,
Ele tornou-se editor,
Comprando a obra do mestre
Por irrisório valor.
E por quase trinta anos
Escreveu e editou.
Delarme, um jovem tipógrafo,
Que Athayde contratou,
Aprendeu tanto a lição
Que ao próprio mestre ensinou.
Em Recife, onde Leandro
Antes se havia instalado,
Athayde radicou-se
Como editor afamado,
Até por Mário de Andrade
Foi bastante elogiado.
Porém, antes de Athayde,
Na Parahyba do Norte,
Francisco Chagas Batista
Ao cordel dava suporte,
Transformando Guarabira
Num centro difusor forte.
Compôs com Leandro a gesta
Do grande Antônio Silvino,
Que antes de Lampião –
Batizado Virgulino –
Tonou-se o mais afamado
Cangaceiro nordestino.
Chagas Batista, porém,
Sobressaiu-se aos seus pares
Quando escreveu Cantadores
E Poetas Populares,
Que como estudo se mostra
Grande entre seus similares.
José Camelo de Melo
Foi poeta imaginoso.
É o autor do Romance
Do Pavão Misterioso,
O Bom Pai e o Mau Filho,
Outro clássico valoroso...
A Verdadeira História
De Joãozinho e Mariquinha,
Coco Verde e Melancia,
Também Pedrinho e Julinha.
Poeta igual Zé Camelo
Naquele tempo não tinha.
Joaquim Batista de Sena
No verso foi magistral,
Era um editor regido
Pelo espírito fraternal.
A Filha Noiva do Pai
É um título genial.
Neste momento voltamos
A falar de Athayde,
Que no final dos 40,
Já alquebrado, decide
Vender a José Bernardo
Os frutos de sua lide.
José Bernardo da Silva,
Um grande empreendedor,
Que em Juazeiro do Norte
Tornar-se-ia editor,
Pois era de Padre Cícero,
Um sincero seguidor.
Zé Bernardo, alagoano
Radicado em Juazeiro
Com sua tipografia
Naquele grande celeiro
Tornou-se uma referência
Para o cordel brasileiro.
Mesmo no Norte, o cordel
Teve um momento brilhante
Com a célebre Guajarina
Fundada por um migrante
Nordestino no Pará,
Num tempo que vai distante.
Francisco Lopes, nascido
No solo pernambucano,
Em Belém, na Guajarina,
Já no décimo quarto ano
Do século que se findou,
Foi quem reinou soberano.
No Norte editou folhetos
Do poeta genial
Piauiense, Firmino
Teixeira do Amaral,
Que nas pelejas forjadas
Jamais encontrou rival.
Pois colocou frente a frente
Num incrível baticum
O Cego Aderaldo com
Zé Pretinho do Tucum,
Mas sendo este fictício,
Foi um duelo incomum.
Luís da Costa Pinheiro
É outro bardo editado
Em Belém por Chico Lopes,
E até hoje é procurado
Seu romance
O Papagaio Misterioso falado.
Manoel Camilo dos Santos
Também se destacaria
Em Guarabira e Campina,
Na Estrella da Poesia;
O país São Saruê
Descreveu com galhardia.
Em Recife inda surgiu
Outra editora de porte
Porque João José da Silva
Dirigiu e deu suporte
À tipografia que
Chamou Luzeiro do Norte.
Poetas dos mais famosos
Nela foram publicados.
José Camelo de Melo,
Dos mais reverenciados,
Na Casa de João José
Teve livros editados.
Severino Borges Silva
Compôs obras geniais.
O Verdadeiro Romance
Do Herói João de Calais
Deixou seu nome gravado
No Livro dos Imortais.
Inda é autor dA Princesa
Do reino do Mar Sem Fim.
Caetano Cosme da Silva,
Guiado por Eloim,
Fez O Assassino da Honra
Ou A Louca do Jardim.
Manoel Pereira Sobrinho
Teve grande projeção,
Pois Dimas e Madalena,
Rosinha e Sebastião
E Helena, a Virgem dos Sonhos,
Entre os clássicos estão.
Vamos citar Zé Faustino,
Apolinário Pereira
Severino Milanês
E Cirilo de Oliveira,
Manoel Cândido da Silva,
Trovadores de primeira.
Mas o cordel vicejou
Muito além da Paraíba,
Pois em Sergipe há nomes
Que nem o tempo derruba
Como Sátyro Xavier
E o Trovador Cotinguiba.
Do imortal Zé Pacheco
Consta no nosso caderno
A Princesa Rosamunda.
E outro clássico eterno
É o folheto A Chegada
De Lampião no Inferno.
Francisco Sales Arêda
Jamais fez um verso atoa
Versou sobre Malazarte
E fez com prosódia boa
O Romance de João Besta
E a Jia da Lagoa.
Já João Ferreira de Lima
Fez história no sertão.
As Proezas de João Grilo,
Sua maior criação,
Se situa ao lado de
José de Souza Leão.
Na Paraíba nascido,
Em Sergipe radicado,
Manoel D’Almeida Filho
Sempre é reverenciado,
Como um dos grandes valores
Que editaram no passado.
À Editora Luzeiro
Servia de consultor,
Vendeu milhões de exemplares,
Como grande trovador,
E é referência pra muitos
Que admiram seu valor.
A Luzeiro a quem Almeida
Dedicou o seu talento,
Surgiu em 73,
Mas foi um desdobramento
Da Editora Prelúdio,
Nascida noutro momento
A Tipografia Souza
Por um português fundada
Em Editora Prelúdio
Nos 50 é transformada.
Arlindo Pinto de Souza
Lidera a nova empreitada.
Com Antônio Teodoro
Dos Santos cresce o cordel
Na capital bandeirante,
Cumprindo um outro papel
Diferente no formato,
Mas à essência fiel.
Teodoro era baiano,
Assim como Minelvino,
Que vê sua obra no centro
Editorial sulino
Alçar vôo considerável,
Além do chão nordestino.
De Alagoas pra Bahia
Vem Rodolfo Cavalcante.
Era poeta de méritos,
Porém nunca foi brilhante,
Mas como líder da classe
Foi ele o mais importante.
Organizando congressos,
Criando agremiações,
Rodolfo batalhou sempre
Por melhores condições
Pra os poetas que inda hoje
Aplaudem suas ações.
Citemos Antônio Eugênio,
Por dever e por estima,
O grande Apolônio Alves
E Natanael de Lima,
Que ao lado dos outros mestres
Estão no andar de cima.
Cuíca de Santo Amaro
Foi um mau versejador,
Sempre de fraque e cartola,
Nas ruas de Salvador,
Fez do sensacionalismo
O seu mote propulsor.
Grande poeta e xilógrafo
É mestre Enéias Tavares,
Também Cícero Vieira,
Entre os vates populares,
Escreveu obras de peso,
Que inda vendem aos milhares.
Dos xilógrafos que escrevem,
Dila se inclui entre os tais,
J. Borges em Bezerros
É conhecido demais.
Antônio Lucena dorme
O sono dos imortais.
Já João Firmino Cabral,
Poeta conceituado,
Por Gregório Nicoló
Na Luzeiro é editado.
E de Manoel D’Almeida
É seguidor declarado.
Desta geração lendária
Brilha Manoel Monteiro.
Mestre Azulão é arauto
Lá no Rio de Janeiro,
Costa Leite é xilógrafo
Famoso no mundo inteiro.
Em São Paulo Jota Barros
Foi peça muito importante;
Em Patos, Antônio Américo
É verdadeiro gigante.
Na Bahia, Antônio Alves
É estrela fulgurante.
Também Gonçalo Ferreira,
Unindo a experiência
Ao saber adquirido
E à inata inteligência,
Divulga nos seus folhetosI
Informação e ciência.
Preside a Academia Brasileira de Cordel –
Por sigla ABLC –
Recanto do menestrel,
Onde todos são bem vindos,
Do mascate
ao bacharel.
Filho de Francisco Chagas,
Pioneiro cordelista,
Em Anápolis reside
O Paulo Nunes Batista,
Autor de Zé Bico Doce
E brilhante ABCdista.
O cordel está presente
No centro-sul do país
Na arte de Cícero Pedro
E do maranhense Assis,
Costa Senna e Cacá Lopes,
Fazendo o povo feliz.
Moreira de Acopiara
É cordelista aclamado;
E Sebastião Marinho,
Paraibano arretado,
Valdeck de Garanhuns,
Mamulengueiro afamado.
Da novíssima geração
Sobressaem no momento
O jovem Jenerson Alves
E Varneci Nascimento.
Fazem crítica social,
Com muito discernimento.
No Rio, Marcus Lucena
É músico e cordelista;
Bráulio Tavares, poeta,
Escritor e ensaísta;
Chico Salles faz cordel
E é um grande sambista.
Marcelo Soares deve
Ser citado com louvor,
Porque no verso faz arte
E na xilo é professor.
Filho de José Soares,
Respeitado trovador.
Fazendo história na terra
Do velho cego Aderaldo,
Surgiu a Tupynanquim
Com elenco de respaldo:
Rouxinol do Rinaré,
Com Klévisson e Arievaldo.
O Evaristo Geraldo
É irmão de Rinaré.
No Ceará também brilham
Gonzaga de Canindé,
E Pedro Paulo Paulino,
Em quem pomos muita fé.
Zé Maria em Fortaleza,
Cordelista e cantador,
Geraldo Amâncio Pereira
Dispensa apresentador,
O poeta Vidal Santos
É outro batalhador.
O Rio Grande do Norte
Volta a seus dias de glória,
Pois lá Antônio Francisco
Há anos já faz história
E Luiz Campos também
Traça bela trajetória.
Mas as mulheres também
No cordel marcam presença:
Maria Ilza Bezerra
Escreve debate e pensa
Como Clotilde Tavares,
Que tem verve e tem sabença.
Duas outras editoras
Fazem bonito papel:
Queima-Bucha em Mossoró
Dignifica o cordel;
E a Coqueiro no Recife
À nossa arte é fiel.
Já o autor deste folheto
É natural da Bahia.
O seu nome é Marco Haurélio,
Um servo da poesia,
Que em palestras e oficinas
Aos mestres reverencia.
João Gomes, que é da obra
Grande colaborador,
Xilógrafo alagoano,
Poeta, pesquisador,
Premiado teatrólogo,
Músico e compositor.
Desde já agradecemos
Pela sua paciência
Ou mesmo a sua leitura,
Porque temos consciência
Sem leitor não há cordel
E o prêmio do menestrel
É sua honrosa audiência.
(postado por Marina n°24, 6ªD)
realmente é uma bela revisão da história do cordel, gostei muito !!!!
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